ENFERMAGEM, CIÊNCIAS E SAÚDE

Gerson de Souza Santos - Bacharel em Enfermagem, Especialista em Saúde da Família, Mestrado em Enfermagem, Doutorado em Ciências da Saúde - Universidade Federal de São Paulo. Atualmente professor do Curso de Medicina do Centro Universitário Ages - Irecê-Ba.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

FISIOLOGIA DO CICLO MENSTRUAL



O ciclo menstrual é o resultado dos eventos coordenados pelo eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano através de mecanismos de retroalimentação e de sua natureza cíclica. Para o melhor entendimento do ciclo menstrual normal, podemos dividi-lo em três fases: Folicular, Ovulação e Lútea. O controle é feito com a participação das gonadotrofinas (FSH e LH), e dos hormônios esteroides ovarianos. Além disso, mais três peptídeos também participam da regulação do ciclo: a inibina, a ativina e a folistatina que regulam a ação e produção do FSH. Por último, há também fatores de crescimento, dos quais o mais importante é o IGF, responsável pela atenuação ou amplificação dos efeitos do LH e FSH. A partir do estímulo feito pela liberação pulsátil do GnRH, as células gonadotróficas da hipófise anterior produzem e secretam os Hormônios Luteinizante (LH) e Folículo Estimulante (FSH). Esses, por sua vez, sofrem influência direta dos esteroides ovarianos (estradiol e progesterona) e pela inibina que modulam a frequência e a amplitude do pulso das gonadotrofinas.

FASE FOLICULAR
A fase folicular inicia-se no primeiro dia da menstruação e dura até o pico do LH, apresentando uma duração média de 10 a 14 dias. Nesta fase um pool de folículos é selecionado para iniciar seu crescimento, sendo que apenas um deles irá completar seu desenvolvimento até atingir a ovulação. É dividida em três estágios. 

FOLÍCULO PRÉ-ANTRAL
A diminuição nos níveis dos esteroides gonadais permite a elevação na secreção de FSH, por um mecanismo de feedback positivo na hipófise. O FSH, por sua vez, em níveis crescentes irá estimular o crescimento folicular até atingir o estágio antral.

FOLÍCULO ANTRAL
Na estrutura folicular pré-antral e antral, as células da teca apresentam os receptores de LH, enquanto as células da granulosa apresentam os receptores de FSH. Em tal situação, o LH estimula a produção de androgênio e o FSH induz a sua  aromatização em estrogênio. O folículo com maior número de receptores de FSH irá se desenvolver e os demais entrarão em atresia. Essa ocorre pela diminuição nos níveis de FSH consequente ao aumento dos níveis de estrogênios (feed back negativo). Os altos níveis estrogênicos intrafolicular do folículo dominante levam a um aumento de receptores de FSH e LH nas células da granulosa. Esse fenômeno irá promover uma melhor resposta do folículo ao pico de LH, responsável pela ovulação. Além disso, o folículo dominante possui maior vascularização, o que possibilita atuação mais eficaz do FSH.

FOLÍCULO PRÉ-OVULATÓRIO
Nessa fase há um aumento na produção de estrogênio, que, em níveis elevados, determina a elevação e pico de LH. O aumento desse hormônio inicia a luteinização da granulosa, que começa a produzir progesterona em baixos níveis, além de, induzir o aumento na síntese de FSH para formação de mais receptores do próprio LH e aumentar a libido devido à maior produção de androgênios pelos folículos atresiados. O pico de LH induz a retomada da meiose do oócito, passando de prófase I para metáfase II. A ovulação ocorre aproximadamente 36 horas após o inicio da elevação do LH e 18 horas após o seu pico.

FASE DE OVULAÇÃO

Há uma distensão do colágeno da parede do folículo devido à ação de enzimas proteolíticas, que, além disso, são responsáveis pela digestão no estigma folicular, o que culmina na ovulação. Os níveis de estradiol caem bastante quando o pico de LH se aproxima, devido aos feedbacks negativos promovidos tanto pela alta concentração de LH quanto de progesterona. Os níveis de FSH que sobem, devido ao estímulo da progesterona, ajudam a liberar o oócito das aderências foliculares, com a conversão de enzimas proteolíticas. Os altos níveis de FSH ainda garantem um bom número de receptores de LH no folículo, permitindo, assim, que a fase lútea seja adequada. 

 FASE LÚTEA
As células da granulosa, nessa fase, apresentam-se aumentadas e amareladas devido ao pigmento luteína. A produção hormonal do corpo lúteo depende da boa quantidade de receptores para o LH, desenvolvidos nas fases anteriores, e do próprio LH. Quando o corpo lúteo apresenta sua maior vascularização, por volta do oitavo ou nono dia, há uma maior disponibilidade de colesterol, que servirá de substrato para a produção de progesterona e estrogênio, pelo próprio corpo lúteo. Os elevados níveis de estradiol, progesterona e inibina, presentes nessa fase, inibem a produção de FSH e LH por feedback negativo pois limitam a produção de GnRH hipotalâmico. Isso ocorre para que não haja uma nova maturação folicular durante o ciclo. Além disso, o estrogênio atua aumentando a quantidade de receptores para a progesterona no endométrio. Caso não ocorra a gravidez, com a diminuição fisiológica dos níveis de LH, a sustentação do corpo lúteo será interrompida, com consequente queda nos níveis de estrogênio e progesterona, seguida da descamação do endométrio. Irá ocorrer atrofia do corpo lúteo devido a ação da prostaglandina F2-α, produzido no ovário. O tempo decorrido entre a ovulação e a menstruação é de 14 dias. Caso se concretize a gravidez, o corpo lúteo recebe o estímulo da gonadotrofina coriônica humana (hCG), secretada pelas células do sincíciotrofoblasto, que age de forma semelhante ao LH, sustentando o corpo lúteo e impedindo a sua involução. Com a manutenção do corpo lúteo, persiste a secreção de strogênio e progesterona, que estimulam o endométrio a se tornar receptivo à implantação embrionária. O hCG sustenta a atividade do corpo lúteo, até que a placenta assuma a produção dos esteroides, em torno da 8a à 12a semana de gestação.
PREPARO ENDOMETRIAL
Para que ocorra a gravidez, é necessário que ocorra também a preparação do endométrio. Assim, o estrogênio e a progesterona têm papel fundamental no desenvolvimento vascular, formação glandular e a manutenção dessas alterações. O endométrio, influenciado por esses hormônios, passa por duas fases: a proliferativa e a secretora.
Fase ProliferativaAo iniciar um novo ciclo, com o primeiro dia do sangramento
vaginal, o endométrio começa a se preparar novamente para
receber um possível embrião. Sob a influência estrogênica o
endométrio, que no início do ciclo tem suas glândulas curtas e estreitas e estroma compacto e com pouca atividade mitótica, passa a apresentar suas glândulas proliferativas, assumindo um espessamento com aspecto denso, no período pré ovulatório.
Fase Secretora
Depois da ovulação, o endométrio passa a ser estimulado, também pela progesterona produzida pelo corpo lúteo. As glândulas tornam-se espiraladas e secretoras, com, uma secreção de glicogênio em seu lúmen, e aumenta a vascularização e edema. Caso a gravidez se efetue, o endométrio desenvolvido se mantem. Se, no entanto, a gravidez não acontecer, o corpo lúteo não mais sustentado pelo LH interrompe a produção de progesterona, levando à descamação do endométrio.

Referência Bibliográfica:
Geber, Selmo Guia de bolso de ginecologia / Selmo Geber, Marcos Sampaio, Rodrigo Hurtado. -- São Paulo : Editora Atheneu, 2013.


sábado, 29 de novembro de 2014

CONCEITOS E FERRAMENTAS DA EPIDEMIOLOGIA


Definição de Epidemiologia
Epidemiologia pode ser definida como a ciência que estuda o processo saúde-doença em coletividades humanas, analisando a distribuição e os fatores determinantes das enfermidades, danos à saúde e eventos associados à saúde coletiva, propondo medidas específicas de prevenção, controle ou erradicação de doenças, e fornecendo indicadores que sirvam de suporte ao planejamento, administração e avaliação das ações de saúde. Pelo significado da palavra, podemos entender melhor do que se trata: EPI= sobre DEMO= população LOGOS= estudo A Epidemiologia congrega métodos e técnicas de três áreas principais de conhecimento: Estatística, Ciências da Saúde e Ciências Sociais. Sua área de atuação compreende ensino e pesquisa em saúde, avaliação de procedimentos e serviços de saúde, vigilância epidemiológica e diagnóstico e acompanhamento da situação de saúde das populações.
Você sabe que quem faz os estudos epidemiológicos são os epidemiologistas, mas você sabe de que área são estes profissionais? Vamos conhecer melhor? Epidemiologistas são médicos, enfermeiros, dentistas, estatísticos, demógrafos, nutricionistas, farmacêuticos, assistentes sociais, geógrafos, dentre outros profissionais. Os epidemiologistas trabalham em salas de aula, serviços de saúde, laboratórios, escritórios, bibliotecas, arquivos, enfermarias, ambulatórios, indústrias e também nos mais variados locais de realização de trabalhos de campo. A epidemiologia tem como princípio básico o entendimento de que os eventos relacionados à saúde, como doenças, seus determinantes e o uso de serviços de saúde não se distribuem ao acaso entre as pessoas. Há grupos populacionais que apresentam mais casos de certo agravo, por exemplo, e outros que morrem mais por determinada doença. Tais diferenças ocorrem porque os fatores que influenciam o estado de saúde das pessoas se distribuem desigualmente na população, acometendo mais alguns grupos do que outros.
Início da Epidemiologia
Alguns autores indicam que a Epidemiologia nasceu com Hipócrates na Grécia antiga. Numa época em que se atribuía as doenças, as mortes e as curas a deuses e demônios, o médico grego se contrapôs a tal raciocínio e difundiu a ideia de que o modo como as pessoas viviam, onde moravam, o que comiam e bebiam, enfim, fatos materiais e terrenos eram os responsáveis pelas doenças. Foi uma proposta revolucionária de se pensar o processo saúde-doença. No entanto, a maior parte dos pesquisadores aponta o médico britânico John Snow como o pai da Epidemiologia. 

Durante boa parte do século XIX e nos séculos anteriores, no campo científico, a teoria miasmática1 era a principal forma de explicação das doenças. Porém, quando uma violenta epidemia de cólera atingiu Londres em 1854, Snow lançou mão de rigoroso método científico e fez uma ampla, inovadora e criteriosa pesquisa. Ao final, relatou que as feições clínicas da doença revelavam que “o veneno da cólera entra no canal alimentar pela boca, e esse veneno seria um ser vivo, específico, oriundo das excreções de um paciente com cólera. [...] Assinalou, afinal, que o esgotamento insuficiente permitia que os perigosos refugos dos pacientes com cólera se infiltrassem no solo e poluíssem poços.”. Você sabe o que há de espetacular no raciocínio de Snow? Ele relatou a transmissão hídrica de microorganismos sem microscópio e 30 anos antes de Robert Koch isolar e cultivar o Vibrio cholarae!!! O uso da ciência e de ferramentas epidemiológicas salvou
muitas vidas e ampliou a discussão sobre as causas das doenças. Outros nomes importantes na história da epidemiologia foram o de John Graunt (1620-1674), pioneiro em quantificar os padrões de natalidade e mortalidade; Pierre Louis (1787-1872), utilizando o método epidemiológico em investigações clínicas de doenças; Louis Villermé (1782-1863), que pesquisou o impacto da pobreza e das condições de trabalho na saúde das pessoas; e William Farr (1807- 1883), na produção de informações epidemiológicas sistemáticas para o planejamento de ações de saúde.


domingo, 5 de outubro de 2014

Acne vulgar (acne comum) e acne cística

 Inflamação muito comum das unidades pilossebáceas.
Aparece em determinadas regiões (face, tronco e, raramente, nádegas).
Mais frequente em adolescentes.
Manifesta-se na forma de comedões, papulopústulas, nódulos e cistos.
Produz cicatrizes escavadas, deprimidas ou hipertróficas.
Epidemiologia
Ocorrência. Muito comum, afetando aproximadamente 85% dos jovens. Idade de início. Puberdade; pode surgir aos 25 anos ou mais. Sexo. Quadros mais graves no sexo masculino. Etnia. Incidência menor em asiáticos e africanos. Aspectos genéticos. Há causas genéticas multifatoriais e predisposição familiar. A maioria dos indivíduos com acne cística tem um ou ambos os pais com história de acne grave. A acne grave pode estar associada à síndrome XYY (rara).
Patogênese
Os fatores-chave são queratinização folicular, androgênios e Propionibacterium acnes (ver Fig. 1-3). O tamponamento dos folículos (comedão) impede a drenagem do sebo; os androgênios (quantitativa e qualitativamente normais no soro) estimulam as glândulas sebáceas a produzirem mais sebo. A lipase bacteriana (P. acnes) converte lipídeos em ácidos graxos e produz mediadores pró-inflamatórios (interleucina-1 [IL]-1, fator de necrose tumoral [TNF, do inglês tumor necrosis factor]-a) que induzem reação inflamatória. As paredes distendidas dos folículos pilosos rompem-se, e sebo, lipídeos, ácidos graxos, queratina e bactérias penetram na derme, produzindo uma resposta inflamatória de tipo corpo estranho. A inflamação intensa deixa cicatrizes. Fatores contribuintes. Óleos minerais acnegênicos, raramente dioxina, entre outros. Fármacos. Lítio, hidantoína, isoniazida, glicocorticoides, contraceptivos orais, iodetos, brometos e androgênios (p. ex., testosterona), danazol. Outros. Estresse emocional pode causar exacerbações. Obstrução e pressão na pele, como apoiar o rosto na mão, é um fator agravante muito importante que frequentemente passa despercebido (acne mecânica). A acne não é causada por qualquer tipo de alimento.
Manifestações clínicas
Duração das lesões. Semanas a meses. Estação. Frequentemente agravada no outono ou no inverno. Sintomas. Dor nas lesões (especialmente no tipo nódulocístico). Lesões cutâneas. Comedões – abertos (pontos
pretos) ou fechados (pontos brancos); acne comedônica (Fig. 1-1). Pápulas e papulopústulas – ou seja, uma pápula encimada por uma pústula; acne papulopustulosa (Fig. 1-2). Nódulos ou cistos – com diâmetro entre 1 e 4 cm (Fig. 1-4); acne nódulo-cística. Nódulos macios são causados por rupturas e reencapsulamentos repetidos de folículos com inflamação, formação de abscesso (cistos) e reação tipo corpo estranho (Fig. 1-3). Nódulos e cistos únicos, isolados e arredondados coalescem, formando pápulas lineares e tratos
fistulosos (Fig. 1-4). Fístulas: drenando por tratos lineares epiteliais, geralmente nos casos de acne nodosa. Cicatrizes: atróficas deprimidas (frequentemente escavadas) ou hipertróficas (algumas vezes, queloides). Seborreia da face e do couro cabeludo é frequente e, algumas vezes, intensa. Locais prediletos. Face, pescoço, tronco, região proximal do braço, nádegas.



Formas especiais
Acne neonatal. Localizada no nariz e nas bochechas de neonatos ou lactentes, é relacionada ao desenvolvimento glandular; transitória e autolimitada.
Acne escoriada. Ocorre geralmente em mulheres jovens, e é associada a escoriações e cicatrizes extensas em razão de problemas emocionais e psicológicos (transtorno obsessivo-compulsivo).
Acne mecânica. Exacerbações de acne em bochechas, queixo ou fronte causadas por apoiar o rosto nas mãos ou pela pressão causada pelo uso do capacete no futebol americano, por exemplo. 
Acne conglobata. Acne cística grave (Figs. 1-5 e 1-6) com maior envolvimento do tronco do que do rosto. Nódulos coalescentes, cistos, abscessos e úlcera. Ocorre também nas nádegas. A remissão espontânea é rara. Raramente com genótipo XYY ou síndrome do ovário policístico.
Acne fulminante. Adolescentes masculinos. Instalação aguda de acne cística grave com supuração e ulceração; mal-estar geral, fadiga, febre, artralgia generalizada, leucocitose, elevação da velocidade de hemossedimentação (VHS).
Acne tropical. Com foliculite grave, nódulos inflamatórios,
cistos com supuração no tronco e nas nádegas em países tropicais; infecção secundária por Staphylococcus aureus.
Acne ocupacional. Causada por exposição aos derivados
do alcatrão, óleo de corte, hidrocarbonetos clorados (ver “Cloracne”, adiante). Não é restrita a regiões de predileção, podendo surgir em outras áreas (cobertas) do corpo, como braços, pernas enádegas.
Cloracne. Causada por exposição a hidrocarbonetos aromáticos clorados em condutores elétricos, inseticidas e herbicidas. Algumas vezes, muito grave em razão de acidentes industriais ou de intoxicação intencional (p. ex., dioxina).
Acne cosmética. Causada por cosméticos comedogênicos.
Acne por pomada. Localizada na região frontal da cabeça, geralmente em afrodescendentes que aplicam pomada no cabelo. 
Síndrome SAPHO. Sinovite, acne fulminante, pustulose palmoplantar, hidradenite supurativa, hiperceratose e osteíte; muito rara.
Síndrome PAPA. Artrite piogênica estéril, pioderma gangrenoso e acne. Distúrbio autoinflamatório hereditário; muito rara.

Condições acneiformes, mas que não são acne Acne 
Acne associada ao uso de esteroides. Não há comedões. Segue-se a glicocorticoides sistêmicos ou tópicos. Foliculite monomórfica – pequenas pápulas eritematosas e pústulas no tórax e no dorso.
 Acne induzida por fármacos. Não há comedões. Erupção acneiforme monomórfica causada por fenitoína, lítio, isoniazida, doses elevadas de complexo B, inibidores do fator de crescimento epidérmico e compostos halogenados.
Acne estival. Não há comedões. Erupção papulosa após exposição ao sol. Geralmente na fronte, ombros, braços, pescoço e tórax.
Foliculite por gram-negativos.
Múltiplas pequenas pústulas amarelas que cobrem lesões de acne vulgar em indivíduos submetidos à antibioticoterapia de longa duração.
Diagnóstico e diagnóstico diferencial Observação: A presença de comedões é necessária para o diagnóstico de acne de qualquer tipo. Não há comedões nos quadros acneiformes (anteriormente) e nas seguintes patologias: Face – foliculite por S. aureus, pseudofoliculite da barba, rosácea, dermatite perioral. Tronco – foliculite por Malassezia, foliculite por pseudomonas (associada ao uso de banheiras de imersão), foliculite por S. aureus e quadros acneiformes (ver anteriormente).
Exames laboratoriais
Não há indicação de exames laboratoriais. Na grande maioria dos pacientes com acne, os níveis hormonais são normais. Se houver suspeita de distúrbio endócrino, deve-se solicitar a dosagem de testosterona livre, hormônio folículo-estimulante, hormônio luteinizante e sulfato de desidroepiandrosterona (DHEAS, do inglês dehydroepiandrosterone sulfate) para afastar hiperandrogenismo de síndrome do ovário policístico. Quando recalcitrante, a acne também pode estar relacionada à hiperplasia suprarrenal congênita (deficiência de 11b ou 21b hidroxilase). Se estiver sendo planejado tratamento sistêmico com isotretinoína, deve-
se dosar transaminases (AST, ALT), triglicerídeos e colesterol.

Evolução
Com frequência, as lesões regridem no início da terceira década de vida, mas podem persistir até a quarta década ou mais. Há exacerbações no inverno e no período menstrual. As sequelas da acne são as cicatrizes, que podem ser evitadas com o tratamento, especialmente com o uso precoce de isotretinoína por via oral (VO).
Tratamento
O objetivo do tratamento é remover os tampões que obstruem a drenagem dos folículos, reduzir a produção de sebo e tratar a colonização bacteriana. O objetivo em longo prazo é evitar as cicatrizes.
Acne branda
Antibióticos tópicos (clindamicina e eritromicina) e peróxido de benzoíla em gel (2, 5 ou 10%). O uso de retinoides tópicos (ácido retinoico, adapaleno, tazaroteno) requer instruções detalhadas acerca do aumento gradual na concentração, iniciando-se com 0,01% e aumentando-se para 0,025 e 0,05% na forma de creme, gel ou solução. Tratamento combinado com gel de peróxido de benzoíla e de eritromicina é mais eficaz. Observação: A cirurgia para acne (extrações dos comedões) é útil apenas quando realizada apropriadamente e após pré-tratamento com retinoides tópicos.
Acne moderada. Ao esquema anterior, deve-se adicionar antibioticoterapia oral. O esquema com minociclina, 50 a 100 mg/dia, é o mais efetivo, ou doxiciclina 50 a 100 mg, duas vezes ao dia, com redução para 50 mg/dia à medida que se observar melhora. O uso de isotretinoína VO para prevenção
de cicatrizes nos casos de acne moderada tem sido mais comum e é efetivo.
Acne grave. Além do tratamento tópico, há indicação de terapia sistêmica com isotretinoína nos casos de acne cística ou conglobata ou qualquer outro tipo refratário ao tratamento inicial. Esse retinoide inibe a função das glândulas sebáceas e a queratinização e é muito efetivo. Em quase todos os casos, a isotretinoína oral leva à remissão total, que perdura por meses a anos na maioria dos pacientes.
Indicações para isotretinoína oral. Acne moderada, recalcitrante ou nodosa. Contraindicações. A isotretinoína é teratogênica e é obrigatório o uso de contracepção efetiva. O uso concomitante de tetraciclina pode causar quadro de pseudotumor cerebral (edema intracraniano benigno); assim, os dois medicamentos nunca devem ser utilizados ao mesmo tempo. Advertências. Antes do tratamento, é necessário dosar as transaminases (AST, ALT) e os lipídeos sanguíneos. Cerca de 25% dos pacientes evoluem com aumento dos triglicerídeos plasmáticos. Os pacientes podem evoluir com aumento brando a moderado das transaminases, o que tende a se normalizar com redução da dose. Olhos: há relatos de cegueira noturna e os pacientes podem manifestar intolerância às lentes de contato. Pele: é possível haver exantema de tipo eczematoso causado pela secura induzida pelo fármaco e que responde rapidamente ao uso tópico de glicocorticoides de baixa potência (classe III). Secura de lábios e queilite quase sempre ocorrem e devem ser tratados.
Muito raramente observa-se afinamento do cabelo, assim como paroníquia. Nariz: raramente, ocorrem secura e sangramento da mucosa nasal. Outros sistemas: raramente, ocorrem depressão, cefaleia, artrite, dor muscular e pancreatite. Para outras complicações raras, consultar a bula.
Posologia. Isotretinoína, 0,5 a 1 mg/kg em dose fracionada administrada junto às refeições. A maioria dos pacientes tem o problema resolvido em 20 semanas com 1 mg/kg. Em estudos recentes, sugeriu-se que 0,5 mg/kg seria igualmente efetivo. Outros tratamentos sistêmicos para a acne grave. Nos casos graves de acne conglobata ou fulminante, ou nas síndromes SAPHO e PAPA, talvez haja necessidade de tratamento adjunto com glicocorticoides sistêmicos. O inibidor do TNF-a, infliximabe, e o anaquinra* são fármacos que vêm sendo investigados para tratamento das formas graves com resultados promissores. Para cistos e nódulos inflamatórios, a infiltração intralesional com triancinolona (0,05 mL de solução com 3 a 5 mg/mL) é útil. Site na internet: http://www.aad.org/pamphlets/acnepamp.html. 

Rosácea CID-9: 695.3 + CID-10: L71 h d Distúrbio acneiforme inflamatório crônico comum das unidades pilossebáceas da face.Associado ao aumento da reatividade dos capilares, levando a rubor e telangiectasia.Pode resultar em espessamento elástico de nariz, bochechas, fronte ou mento em razão de hiperplasia sebácea, edema e fibrose.
Epidemiologia
Ocorrência. Frequente, afetando aproximadamente 10% dos indivíduos com pele clara. Idade de início. 30 a 50 anos; pico de incidência entre 40 e 50 anos. Sexo. Predominantemente feminino, mas o rinofima ocorre principalmente no sexo masculino. Etnia. Célticos (fototipos cutâneos I e II), mas também em originários da região sul do Med
iterrâneo; menos frequente em indivíduos pigmentados (fototipos cutâneos V e VI, i.e., pardos e negros). Estadiamento (classificação de Plewig e Kligman) Diátese rosácea: eritema episódico, “corado e ruborizado”. Estágio I: eritema persistente com telangiectasias. Estágio II: eritema persistente, telangiectasias, pápulas e diminutas pústulas. Estágio III: eritema profundo e persistente, telangiectasias densas, pápulas, pústulas, nódulos; raramente, edema “sólido” persistente na região central da face. Observação: nem sempre há evolução de um estágio a outro. A rosácea pode se instalar nos estágios II ou III ou haver sobreposição de estágios.
Manifestações clínicas
História de episódios de vermelhidão na face (rubor) em resposta a líquidos quentes, alimentos condimentados, bebidas alcoólicas, exposição ao sol ou ao calor. É possível que haja antecedentes de acne por anos, mas a rosácea geralmente é um quadro novo. Duração das lesões. Dias, semanas, meses. Sintomas relacionados à pele. Preocupação com o aspecto estético da face. Lesões cutâneas. Estágio inicial. Rubor patognomônico – “rosto vermelho” (Fig. 1-7); minúsculas pápulas e papulopústulas (2 a 3 mm), sendo que a pústula geralmente é pequena (≤ 1 mm) e encontra- se no ápice da pápula (Figs. 1-8 e 1-9). Não há comedões.


Estágio avançado. Fácies vermelha e pápulas e nódulos vermelho-escuros (Figs. 1-8 a 1-11). Lesões isoladas dispersas. Telangiectasias, hiperplasia sebácea acentuada e linfedema na rosácea crônica, causando desfiguração de nariz, fronte, orelhas e mento (Fig. 1-11). Distribuição. Simétricas na face (Fig. 1-10). Raramente, ocorrem em pescoço, tórax (área em V), dorso e couro cabeludo. Lesões especiais Rinofima (nariz aumentado), metofima (tumefação em forma de almofada na região da fronte), blefarofima (tumefação palpebral), otofima (tumefação dos lóbulos da orelha em forma de couve-flor) e gnatofima (tumefação do mento) em consequência de hiperplasia acentuada das glândulas sebáceas (Fig. 1-11) e fibrose. À palpação, consistência macia e elástica. Envolvimento ocular Olhos “vermelhos” são causados por blefarite crônica, conjuntivite e episclerite. A ceratite por rosácea, embora rara, é um problema grave em razão da possibilidade de evolução para úlcera da córnea.
Exames laboratoriais
Culturas para bactérias. Para afastar a possibilidade de infecção por S. aureus. Os raspados podem revelar infestação maciça por Demodex folliculorum. Dermatopatologia. Inflamação perifolicular e pericapilar inespecífica com focos ocasionais de áreas granulomatosas “tuberculoides”; capilares dilatados. Estágios avançados: hipertrofia difusa de tecido conectivo, hiperplasia de glândulas sebáceas e granuloma epitelioide sem cáseo. Diagnóstico diferencial Pápulas/pústulas faciais. Acne (na rosácea, não há comedões), dermatite perioral, foliculite por S. aureus, foliculite por gram-negativos, infestação por D. folliculorum. Eritema/rubor facial. Dermatite seborreica, uso prolongado de glicocorticoides tópicos, lúpus eritematoso sistêmico; dermatomiosite.


Fonte: Dermatologia de Fitzpatrick - Atlas e Texto 7ª Edição - Autor: Klaus Wolff; Richard A. Johnson; Arturo P. Saavedra - Editora: McGraw-Hill

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Perguntas e Respostas sobre Chikungunya

  

O que é Chikungunya?
É uma doença infecciosa febril, causada pelo vírus Chikungunya (CHIKV), que pode ser transmitida pelos mosquitos Aedes aegypti e Aedes albopictus.
O que significa o nome?
Significa “aqueles que se dobram” em swahili, um dos idiomas da Tanzânia. Refere-se à aparência curvada dos pacientes que foram atendidos na primeira epidemia documentada, na Tanzânia, localizada no leste da África, entre 1952 e 1953.
Qual a área de circulação do vírus?
O vírus circula em alguns países da África e da Ásia. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), desde o ano de 2004 o vírus já foi identificado em 19 países. Naquele ano, um surto na costa do Quênia propagou o vírus para Comores, Ilhas Reunião e outras ilhas do oceano Índico, chegando, em 2006, à Índia, Sri Lanka, Ilhas Maldivas, Cingapura, Malásia e Indonésia. Nesse período, foram registrados aproximadamente 1,9 milhão de casos – a maioria na Índia. Em 2007, o vírus foi identificado na Itália. Em 2010, há relato de casos na Índia, Indonésia, Mianmar, Tailândia, Ilhas Maldivas, Ilhas Reunião e Taiwan – todos com transmissão sustentada. França e Estados Unidos também registraram casos em 2010, mas sem transmissão autóctone (quando a pessoa se infecta no local onde vive). Recentemente o vírus foi identificado nas Américas.
Qual é a situação do Chikungunya nas Américas?
No final de 2013, foi registrada transmissão autóctone em vários países do Caribe (Anguila, Aruba, Dominica, Guadalupe, Guiana Francesa, Ilhas Virgens Britânicas, Martinica, República Dominicana, São Bartolomeu, São Cristóvão e Nevis, Santa Lúcia e São Martinho) e em março de 2014, na República Dominicana. Toda a população do continente é considerada como vulnerável, por dois motivos: como nunca circulou antes em nossa região, ninguém tem imunidade ao vírus e ambos os mosquitos capazes de transmitir a doença estão presentes em praticamente todas as áreas das Américas.



SINAIS E SINTOMAS
Quais os principais sinais e sintomas?
Febre acima de 39 graus, de início repentino, e dores intensas nas articulações de pés e mãos – dedos, tornozelos e pulsos. Pode ocorrer, também, dor de cabeça, dores nos músculos e manchas vermelhas na pele. Cerca de 30% dos casos não chegam a desenvolver sintomas.
Como se identifica um caso suspeito?
O Ministério da Saúde definiu que devem ser consideradas como casos suspeitos todas as pessoas que apresentarem febre de início súbito maior de 38,5ºC e artralgia (dor articular) ou artrite intensa com início agudo e que tenham histórico recente de viagem às áreas nas quais o vírus circula de forma contínua.
Após a picada do mosquito, em quantos dias ocorre o início dos sintomas?
De dois a dez dias, podendo chegar a 12 dias. Esse é o chamado período de incubação.
Se a pessoa for picada neste período, infectará o mosquito?
Isso pode ocorrer um dia antes do aparecimento da febre até o quinto dia de doença, quando a pessoa ainda tem o vírus na corrente sanguínea. Este período é chamado de viremia.
Dor nas articulações também não ocorre nos casos de dengue?
Sim, mas a intensidade é menor. Em se tratando de Chikungunya, é importante reforçar que a dor articular, presente em 70% a 100% dos casos, é intensa e afeta principalmente pés e mãos (geralmente tornozelos e pulsos).
Existem grupos de maior risco?
O vírus pode afetar pessoas de qualquer idade ou sexo, mas os sinais e sintomas tendem a ser mais intensos em crianças e idosos. Além disso, pessoas com doenças crônicas têm mais chance de desenvolver formas graves da doença.
As pessoas podem ter Chikungunya e dengue ao mesmo tempo? Sim.
TRANSMISSÃO
Como o vírus é transmitido?
O vírus é transmitido pela picada da fêmea de mosquitos infectados. São eles o Aedes aegypti, de presença essencialmente urbana, em áreas tropicais e, no Brasil, associado à transmissão da dengue; e o Aedes albopictus, presente majoritariamente em áreas rurais, também existente no Brasil e que pode ser encontrado em áreas urbanas e peri-urbanas em menor densidade. O mosquito adquire o vírus CHIKV ao picar uma pessoa infectada, durante o período de viremia.
Qual a diferença entre a distribuição dos mosquitos Aedes aegypti e Aedes albopictus?
O Aedes aegypti tem presença essencialmente urbana e a fêmea alimenta‐se preferencialmente de sangue humano. O mosquito adulto encontra‐se dentro das residências e os habitats das larvas estão mais frequentemente em depósitos artificiais (pratos de vasos de plantas, lixo acumulado, pneus, recipientes abandonados etc.). O Aedes albopictus está presente majoritariamente em áreas rurais, peri-urbanas e alimenta‐se principalmente de sangue de outros animais, embora também possa se
alimentar de sangue humano. Suas larvas são encontradas mais frequentemente em habitats naturais, como internódios de bambu, buracos em árvores e cascas de frutas. Recipientes artificiais abandonados nas florestas e em plantações também podem servir de criadouros.
Se um pessoa for picada por um mosquito infectado necessariamente ficará doente?
Não. Em média, 30% das pessoas infectadas são assintomáticas, ou seja, não apresentam os sinais e sintomas clássicos da doença.
Quem se infecta com o vírus fica imune?
Sim. Quem apresentar a infecção fica imune o resto da vida.
Uma pessoa doente pode infectar outra saudável?
Não existe transmissão entre pessoas. A única forma de infecção é pela picada dos mosquitos.
A mãe grávida transmite o vírus para o bebê?
Não há evidências de que o vírus seja transmitido da mãe para o feto durante a gravidez. Porém, a infecção pode ocorrer durante o parto. Também não há evidências de transmissão pelo leite materno.
É possível a transmissão por transfusão sanguínea?
Com os cuidados da segurança do sangue que a rede de hemocentros no Brasil já adota para evitar transmissão de doenças por transfusão, não se considera essa via uma forma de transmissão com importância para a saúde pública.

 
NOTIFICAÇÃO DE CASOS
Já existem casos no Brasil?
Em 2014, no Brasil, entre os meses de julho e agosto, foram confirmados 37 casos de Chikungunya importados, de pacientes originários, principalmente, do Haiti e República Dominicana. Em setembro, foram confirmados dois casos autóctones no município do Oiapoque, Amapá. Ambos os casos são de residentes no município, sendo filha e pai, com início dos sintomas em 26 e 27 de agosto, respectivamente. Diante da confirmação dos casos, o município de Oiapoque, com apoio do Ministério da Saúde e da Secretaria de Estado da Saúde do Amapá, intensificou as medidas de controle da doença. Dentre as ações, estão a busca ativa de novos casos suspeitos com alerta nas unidades de saúde e comunidade, a remoção e tratamento químico de criadouros de mosquitos Aedes aegypti, além da aplicação de inseticida (fumacê) para reduzir a densidade dos vetores. Os profissionais de saúde já receberam orientações para o manejo adequado dos pacientes.
Que medidas podem ser adotadas para evitar a disseminação do vírus?
O mais importante é evitar os criadouros dos mosquitos que podem transmitir a doença. Isso previne tanto a ocorrência de surtos de dengue como de Chikungunya. Quando há notificação de caso suspeito, as Secretarias Municipais de Saúde devem adotar ações de eliminação de focos do mosquito nas áreas próximas à residência, ao local de atendimento dos pacientes e nos aeroportos internacionais da cidade em que aqueles residam.
A notificação de casos é obrigatória?
No Brasil, sim. Os casos suspeitos de Chikungunya devem ser comunicados e/ou notificados em até 24 horas a partir da suspeita inicial. Qualquer estabelecimento de saúde, público ou privado, deve informar a ocorrência de casos suspeitos às Secretarias Municipais e Estaduais de Saúde e ao Ministério da Saúde.
DIAGNÓSTICO
Como saber se de fato uma pessoa tem Chikungunya?
O vírus só pode ser detectado em exames de laboratório. São três os tipos de testes capazes de detectar o Chikungunya: sorologia, PCR em tempo real (RT‐PCR) e isolamento viral. Todas essas técnicas já são utilizadas no Brasil para o diagnóstico de outras doenças e estão disponíveis nos laboratórios de referência da rede pública.
Quantos laboratórios capacitados existem no Brasil? Existe algum de referência?
Atualmente, o laboratório de referência para realizar o diagnóstico laboratorial do Chikungunya é o Instituto Evandro Chagas, do Ministério da Saúde, localizado no Pará. Outros laboratórios de saúde pública estão em fase de treinamento para adotar o exame de detecção do vírus CHIKV.
• Fluxo das amostras para laboratório de referência de acordo com a região do país:  Região Norte – Instituto Evandro Chagas (IEC);  Região Nordeste – Lacen/CE e Lacen/PE;  Região Sudeste – Instituto Adolfo Lutz-SP, Fundação Nacional Ezequiel Dias-MG (Funed) e Fundação Oswaldo Cruz-RJ (Fiocruz);  Região Sul – Lacen/PR;  Região Centro-Oeste – Lacen/DF.
TRATAMENTO E PREVENÇÃO
Como é feito o tratamento?
Até o momento não existe um tratamento específico para Chikungunya, como no caso da dengue. Os sintomas são tratados com medicação para a febre (paracetamol) e as dores articulares (antiinflamatórios). Não é recomendado usar o ácido acetil salicílico (AAS) devido ao risco de hemorragia. Recomenda‐se repouso absoluto ao paciente, que deve beber líquidos em abundância.
É necessário isolar o paciente?
Não é necessário, o paciente deve ficar em repouso.
O que as pessoas podem fazer para se prevenir?
Como a doença é transmitida por mosquitos, é fundamental que as pessoas reforcem as medidas de eliminação dos criadouros de mosquitos nas suas casas e na vizinhança. As medidas que as pessoas devem tomar são exatamente as mesmas recomendadas para a prevenção da dengue.
Existe vacina?
Não.
VIGILÂNCIA DE CASOS IMPORTADOS
Há casos em que é necessário internar a pessoa?
Sim, mas apenas nos casos que apresentarem maior gravidade.
Em quanto tempo o paciente se recupera?
Em geral, em dez dias após o início dos sintomas. No entanto, em alguns casos as dores nas articulações podem persistir por meses. Nesses casos, o paciente deve voltar à unidade de saúde para avaliação médica.
A doença pode matar?
As mortes são raras. Dados da epidemia ocorrida em 2004, nas Ilhas Reunião, indicaram taxa de letalidade de 0,1% (256 mortes em um total de 266 mil casos). Entretanto, na Índia, em 2006, houve 1,3 milhão de casos e nenhuma morte registrada.

 
ORIENTAÇÕES EM CASO DE SUSPEITA
Será adotada alguma medida em fronteiras e aeroportos?
Para doenças como Chikungunya não existem medidas efetivas em fronteiras ou aeroportos, pois a pessoa pode viajar durante o período de incubação ou ser um caso assintomático. Além disso, os sintomas de Chikungunya são semelhantes aos de outras doenças. Assim, a melhor prevenção e cada pessoa buscar eliminar os criadouros de mosquitos na sua casa e vizinhança.
O que a pessoa deve fazer se suspeitar que tem Chikungunya?
Procurar a unidade de saúde mais próxima, imediatamente. E, fundamental: NÃO TOMAR REMÉDIO POR CONTA PRÓPRIA. A automedicação pode mascarar sintomas,
dificultar o diagnóstico e agravar o quadro do paciente. Somente um médico pode receitar medicamentos.
O que as pessoas podem fazer para evitar a doença?
Como a doença Chikungunya é transmitida por mosquitos, é fundamental que as pessoas reforcem as medidas de eliminação dos criadouros das espécies. Elas são exatamente as mesmas para o controle da dengue, basicamente, não deixar acumular água em recipientes. Entre outras medidas, são muito efetivas: verificar se a caixa d´água está bem fechada; não acumular vasilhames no quintal; verificar se as calhas não estão entupidas; e colocar areia nos pratos dos vasos de planta. Os procedimentos de controle são semelhantes para ambos os mosquitos
.
Fonte: http://www.unasus.gov.br/noticia/saude-atualiza-situacao-do-virus-chikungunya

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

DOENÇA DIVERTICULAR DO CÓLON





1. Conceito



Um divertículo representa uma protrusão sacular de uma víscera oca. Um pseudo-divertículo é aquele constituído apenas pela mucosa e pela serosa do órgão (no caso de vísceras ocas intraperitoneais). Os divertículos de intestino grosso podem ser verdadeiros (constituídos por todas as camadas do cólon), porém os de importância clínica são pseudo-divertículos e representam, dessa forma, herniação da mucosa através da parede do cólon.

Embora sob o ponto de vista anatomopatológico a moléstia seja caracterizada pelo aparecimento dos divertículos, é a anormalidade da camada muscular a alteração que melhor define a enfermidade e que conduz à formação dos divertículos. A partir destas alterações musculares pode-se distinguir duas formas distintas da doença:

a) Doença Diverticular Hipotônica dos Cólons: cuja característica anatomopatológica é representada por uma camada muscular delgada, hipotrófica; constitui-se na forma mais freqüente da doença;

b) Doença Diverticular Hipertônica dos Cólons: caracterizada anatomopatologicamente pela presença de uma camada muscular espessa, hipertrofiada.

Embora seja a forma menos freqüente da doença diverticular é a que tem um quadro clínico mais expressivo, com sintomatologia característica, embora não patognomônica, e que pode levar a um índice maior de complicações.

Ocorre no adulto jovem, com predominância de aparecimento entre a terceira e a quarta décadas; entretanto, face a evolução tediosa e crônica da enfermidade, ela pode ser encontrada na população mais idosa e coexistir com a forma hipotônica da doença determinando uma forma mista, difícil de ser avaliada e explicada.

Predomina na raça caucasiana, sem prevalência de sexo.

A presença de divertículos no cólon é conhecida como diverticulose e é usualmente empregada para distinguir a ausência de sintomas associados aos divertículos. A diverticulite é o processo inflamatório e infeccioso associado aos divertículos e representa a principal complicação da diverticulose. A doença diverticular do cólon inclui todas as manifestações associadas aos divertículos, desde sua simples presença até a ocorrência de sintomas ou complicações (diverticulite aguda e sangramento). A diverticulite aguda, por sua vez, pode ser simples ou complicada (associada à formação de abscesso, fístula, obstrução ou peritonite difusa). O termo diverticulite perfurada, historicamente utilizado para classificar uma complicação da diverticulite aguda, deveria ter seu emprego desestimulado uma vez que em todas as crises de diverticulite aguda ocorre perfuração (ainda que microscópica na maioria das vezes). Diverticulite perfurada usualmente distingue a diverticulite aguda com contaminação difusa da cavidade peritoneal associada ou não a pneumoperitônio.





2. Epidemiologia



A maioria dos pacientes com divertículos é assintomática o que dificulta a estimativa de sua prevalência. A prevalência da diverticulose colônica aumenta com a idade. Parece inferior a 10% para a população com menos de 40 anos, atinge um terço da população acima dos 45 anos e está estimada entre 50% e 66% para os indivíduos com mais de 80 anos podendo atingir até 80% dessa população idosa. Não existe evidente correlação com o sexo. Dez a 25% dos indivíduos com diverticulose evoluirão com diverticulite. As evidências provenientes de estudos observacionais epidemiológicos e que contemplam dados de necrópsias indicam que a doença diverticular resulta da ocidentalização de hábitos alimentares que incluem dietas com alto teor de carboidratos refinados e pobres em fibras. Conhecida como doença da civilização ocidental, a afecção é rara na Ásia e na África rurais e as maiores prevalências são observadas nos Estados Unidos, Europa Ocidental e Austrália.



3. Etiologia e fisiopatologia



Divertículos do cólon podem variar em número desde solitários ou raros até centenas. São mais frequentemente observados na topografia dos vasos retos mesocólicos. Esses vasos, ao atravessarem a camada muscular própria a partir da subserosa e comunicar-se com a rede vascular submucosa, originam regiões de fraqueza na parede do cólon e, portanto, predispõem à herniação da mucosa através da espessura do cólon. Os divertículos, que são por origem adquiridos e de pulsão, podem acometer todo o cólon e ocorrem em duas fileiras paralelas e adjacentes às duas bordas da tênia mesocólica (Fig.1). A etiologia da doença diverticular do cólon permanece parcialmente esclarecida. Existem evidências que apontam para a ação de três fatores: redução da resistência da parede do cólon, dismotilidade e dieta pobre em fibras.

Com relação à redução da resistência da parede do cólon, é possível que mudanças decorrentes da idade levem a alteração na composição da matriz extracelular da musculatura lisa colônica. Essas alterações teriam portanto origem degenerativa consistindo em modificações na composição do colágeno com aumento do componente de elastina, esta última alteração já demonstrada por observações por microscopia eletrônica.

Evidências sobre o papel de distúrbios da motilidade colônica como causa da doença diverticular vêm sendo obtidas há alguns anos. Postulou-se a teoria da segmentação colônica, na qual a ação da musculatura lisa em sintonia com as pregas semilunares da mucosa levaria ao aparecimento de múltiplas câmaras (que corresponderiam às haustrações) onde a pressão estaria grandemente aumentada, favorecendo a pulsão da mucosa contra os pontos de fraqueza na parede colônica na entrada dos vasos retos levando então ao aparecimento dos divertículos.

A grande variação na prevalência dessa afecção, bem como sua estreita correlação com a dieta ocidental, há muito sugerem a existência de um fator etiológico presente na dieta. Painter e Burkitt observaram em mais de 1.200 habitantes do Reino Unido e de Uganda que os primeiros, ingerindo dieta ocidental pobre em fibra e refinada (massa fecal diária de aproximadamente 110 gamas), exibiam tempo de trânsito intestinal duas vezes maior do que os africanos que se alimentavam de dieta rica em fibras e tinham massa fecal avaliada em aproximadamente 450 gramas por dia. Postulou-se que tempos de trânsito intestinal prolongado resultantes de dieta pobre em fibras levariam a significativo aumento das pressões intraluminares e predisporiam à formação de divertículos. No entanto, quando olhamos para uma população inteiramente ocidental, tais diferenças na composição da dieta e na duração do tempo de trânsito não foram elucidativas. Tampouco estudos de intervenção estão disponíveis para comprovar a evidência epidemiológica.

Com relação à fisiopatologia da diverticulite aguda, uma vez que divertículos estejam presentes, partículas de comida não-digeridas ou fezes ressecadas podem se acumular em seu interior. A obstrução do colo do divertículo por essas substâncias resultaria em aumento da pressão no interior do divertículo e/ou hiperproliferação bacteriana. O divertículo, cuja parede tem espessura de mucosa isolada é altamente susceptível à isquemia e subseqüente perfuração.



4. Quadro clínico e diagnóstico



A – Doença Diverticular Não-Complicada



A maioria dos pacientes com diverticulose permanecerá completamente assintomática durante a vida e frequentemente os divertículos representam achados de sigmoidoscopias ou colonoscopias de rastreamento.

 Por outro lado, pacientes com divertículos podem queixar-se de dor ou sensibilidade abdominal em baixo ventre ou mais caracteristicamente em quadrante inferior esquerdo associada a alterações do hábito intestinal. A dor pode ser acentuada pela refeição e aliviada pela evacuação e “gases” representa uma queixa comumente associada. A constipação pode representar complicação da diverticulose na forma de estenose porém pode fazer parte da etiologia da doença. Da mesma forma, um aumento do número de evacuações pode ser secundária a diminuição da complacência do sigmóide. Ao exame físico, pode ser percebida leve sensibilidade à palpação do quadrante inferior esquerdo. Esse quadro é geralmente distinguido pela denominação de cólica diverticular e representa a manifestação clínica da doença diverticular não-complicada.

O diagnóstico diferencial mais importante a ser estabelecido é com a síndrome do intestino irritável. Se as duas doenças são ou não distintas, não se sabe; no entanto a importância do diagnóstico diferencial diminui uma vez que o tratamento clínico é semelhante e a presença de divertículos não é contra-indicação à intervenção medicamentosa destinada a tratar o intestino irritável. Com relação ao diagnóstico da doença diverticular não-complicada, o enema opaco provê informações com elevada acurácia acerca da presença e da localização dos divertículos de cólon de forma superior à colonoscopia. No entanto, a sensibilidade do exame radiológico para o diagnóstico de pólipos e carcinoma é reduzida se comparada à da colonoscopia especialmente na vigência de divertículos. Daí a importância da realização da colonoscopia diagnóstica especialmente se os sintomas sugestivos de diverticulose não-complicada incluem a alteração do hábito intestinal e emagrecimento. Numerosas séries e anos de experiência demonstraram a segurança do exame colonoscópico cuidadoso na diverticulose não-complicada afastando o temor de que essa afecção representaria relativa contra-indicação à endoscopia do cólon.



B – Diverticulite Aguda



A diverticulite aguda representa a mais freqüente complicação da diverticulose do cólon e estima-se afetar entre 10 e 25% dos pacientes com divertículos do cólon. É resultante de micro ou macroperfuração de um divertículo isolado. A dor no quadrante inferior esquerdo ocorre em 70% dos pacientes com diverticulite aguda e está mais comumente presente por vários dias antes do diagnóstico, o que permite diferenciá-la de outras causas de abdome agudo inflamatório. Em pacientes com cólon sigmóide redundante, a dor em baixo ventre ou mesmo em quadrante inferior direito pode ocorrer. Até metade dos pacientes refere um ou mais episódios semelhantes anteriores. Pode haver história de alteração da freqüência evacuatória (sendo a diarréia a mais freqüente) podendo também haver náuseas e vômitos. Sintomas urinários tais como disúria e urgência podem ocorrer como resultado de proximidade entre o divertículo perfurado e a bexiga. Ao exame físico, a dor à palpação do quadrante inferior esquerdo é característica. Dor à descompressão brusca localizada é freqüentemente observada, porém dor e defesa à palpação de todos os quadrantes devem sugerir a presença de peritonite difusa. Massa palpável pode ser identificada em cerca de 20% dos casos. O achado de massa palpável requer afastar a presença de carcinoma. Febre baixa e leucocitose são comuns porém pode não haver febre ou leucocitose em até 45% dos casos. A leucocitúria pode ser indicativa da infecção no sigmóide adjacente, o que pode ser confirmado pela urocultura estéril. Ainda que 85% dos casos de diverticulite ocorram em cólon descendente e sigmóide, a diverticulite de cólon direito é observada com grande freqüência entre indivíduos asiáticos e cursa de forma mais benigna exigindo atenção no diagnóstico diferencial com apendicite aguda.

Na diverticulite aguda, a localização e magnitude da contaminação determinam a apresentação clínica e o prognóstico. Microperfurações podem permanecer restritas à gordura pericólica entre folhetos peritoneais do mesossigmóide originando apenas um flegmão ou abscesso pericólico. Perfurações maiores podem resultar na formação de abscessos que podem atingir localmente a cavidade peritoneal, exigindo o bloqueio pelo grande omento ou outros órgãos intraperitoneais (intestino delgado, útero e anexos ou bexiga), originando massa palpável ou trajetos fistulosos. Perfurações em peritônio livre são mais raras, porém podem causar peritonite purulenta ou fecal difusas com ou sem pneumoperitônio identificável à radiografia simples do abdome, situações graves e associadas a variável letalidade. Hinchey e cols. publicaram uma classificação para a intensidade do processo inflamatório e infeccioso na diverticulite aguda (Quadro 1).



Quadro 1:
Classificação de Hinchey
1.                  Abscesso pericólico ou mesentérico
2.                  Abscesso pélvico contido
3.                  Peritonite generalizada purulenta
4.                  Peritonite fecal generalizada



 O diagnóstico diferencial da diverticulite aguda é amplo. A apendicite aguda representa a hipótese diagnóstica errônea mais freqüentemente realizada para os indivíduos com diverticulite aguda. A enterite ou colite de Crohn agudas podem se apresentar com dor abdominal, febre e leucocitose. O câncer de cólon ocorre na mesma faixa etária dos pacientes com diverticulite e representa diagnóstico diferencial importante quando contemplados emagrecimento, massa palpável, alteração importante do hábito intestinal e hematoquezia. A hipótese diagnóstica de colite isquêmica deve ser afastada nos pacientes mais idosos ou com doença aterosclerótica coronariana, de carótidas ou femorais. Afecções ginecológicas agudas devem ser lembradas em mulheres.

O diagnóstico da diverticulite aguda não raramente pode ser realizado com base na anamnese e exame físico bem conduzidos. Recomenda-se que, quando a apresentação deixar poucas dúvidas, não sejam realizados exames adicionais para a comprovação do diagnóstico. No entanto, o diagnóstico clínico isolado pode estar incorreto em até um terço dos casos. Além do mais, a comprovação diagnóstica e documentação de uma crise de diverticulite é útil ao planejamento do acompanhamento e da proposta terapêutica, sobretudo se estes vierem a ser conduzidos por outro especialista. As radiografias simples para abdome agudo (abdome em ortostase e em decúbito e tórax) servem ao diagnóstico de pneumoperitônio e de obstrução intestinal, bem como para avaliação da área cardíaca em uma população mais idosa e com comorbidades. Radiografias anormais serão encontradas em 30 a 50% dos pacientes com diverticulite na forma de níveis hidroaéreos em intestino delgado, dilatação colônica ou imagens de macicez sugerindo abscessos. Devido ao seu baixo custo, baixa invasividade e ampla disponibilidade e também devido a algumas possibilidades terapêuticas que oferece, a ultrassonografia transabdominal tem utilidade na diverticulite aguda. Os achados característicos incluem o espessamento hipoecóico da parede do cólon, visibilização de divertículos, abscesso ou hiperecogenicidade pericólica sugerindo flegmão ou mesmo coleções intraperitoneais. Evidências acerca de similar acurácia no diagnóstico da diverticulite aguda pela ultrassonografia se comparada à tomografia computadorizada (TC) também existem. No entanto deve-se levar em consideração que a ultrassonografia é mais dependente do examinador do que a TC e tem sua eficácia significativamente diminuída na presença de distensão abdominal. As ultrassonografias transabdominal e transvaginal prestam-se muito bem ao diagnóstico diferencial com afecções ginecológicas. Achados considerados diagnósticos na diverticulite aguda são o extravasamento de meio de contraste para uma loja fora do cólon , trajeto fistuloso intramural ou em fistulização para outros órgãos. Massa extraluminal que comprime ou desloca o sigmóide é tida como o mais freqüente achado na diverticulite aguda complicada, porém não é específica para o diagnóstico. Obviamente a ausência de divertículos deveria levar a reconsideração do diagnóstico. Esta é a razão para o entusiasmo que ainda cerca o exame contrastado do cólon como método de diagnóstico útil na diverticulite aguda. A realização do enema opaco é segura na diverticulite aguda desde que apenas o contraste hidrossolúvel isolado (sem ar) seja utilizado.

 Com a ampla disponibilidade da TC, o enema opaco assume posição secundária, embora possa ser útil frente a achados tomográficos inconclusivos. Estudos retrospectivos indicam que o enema opaco tem sensibilidade de 62 a 94% para o diagnóstico da diverticulite aguda. Em função da maior sensibilidade da TC para o diagnóstico das repercussões extraluminais e em órgãos vizinhos, menor dependência do operador, avaliação completa da cavidade abdominal, baixa invasividade e possibilidades terapêuticas, muitos preferem e advogam esse método como de escolha, associando-o a maior relação custo-efetividade na diverticulite aguda. Melhores resultados são obtidos pela administração oral, endovenosa e retal de meio de contraste hidrossolúvel. Os critérios para o diagnóstico de diverticulite incluem: espessamento da parede do cólon acometido, a presença de um único ou múltiplos divertículos, achado de abscesso pericólico, ar fora de alça e infiltração da gordura. A tomografia de abdome na diverticulite aguda tem sensibilidade de 90 a 95%, especificidade de 72% e taxa de falsos-negativos entre 7 e 21%.O valor preditivo da TC para o diagnóstico de diverticulite aguda é de 73% para o achado de divertículos em sigmóide, 88% para o achado de inflamação pericólica, 100% quando considerado o achado de espessamento da parede do cólon maior do que 10 mm, e de 85% quando a parede do cólon tem espessura entre 7 e 10 mm. Vale lembrar que a TC isoladamente não é útil ao diagnóstico diferencial entre diverticulite e câncer. Apesar de sua elevada relação custo-efetividade, não é necessária ao adequado manejo de todos os casos, especialmente para as crises leves, nas quais o diagnóstico de diverticulose já está estabelecido, quando não há suspeita de abscesso e para cujos pacientes se instituirá o tratamento ambulatorial sob risco de se elevar desnecessariamente os custos. Tem sua precípua indicação quando há repercussão da doença sobre o estado geral do doente, quando há dúvida diagnóstica e, é claro, na piora clínica. Devido ao risco de desbloqueio de um divertículo já perfurado ou mesmo de nova perfuração resultante da insuflação de ar ou progressão do aparelho, a endoscopia do sigmóide está historicamente contra-indicada na suspeita de diverticulite aguda. No entanto, a sigmoidoscopia cuidadosa é útil para excluir a presença de câncer, colite inespecífica ou isquêmica. Associadamente, a observação de drenagem purulenta proveniente de um divertículo inflamado adiciona acurácia à hipótese de diverticulite. A avaliação colonoscópica completa deve ser realizada entre seis e oito semanas após a crise de diverticulite aguda se já não houver sido realizada anteriormente por outra indicação.



5. Complicações



A – Complicações da diverticulite aguda



O abscesso e a fístula colovesical são as principais complicações de um episódio de diverticulite aguda.

Quando a perfuração de um divertículo ocorre, a capacidade de bloqueio dos órgãos adjacentes determina a intensidade do quadro clínico. Quando o bloqueio não é suficiente para restringir a contaminação a apenas um flegmão, um abscesso intramesocólico ou pélvico pode se formar. Febre persistente, leucocitose acentuada e ausência de melhora com o tratamento clínico representam os sinais mais comuns.

O diagnóstico de abscesso pode ser suspeitado pela ultrassonografia, porém a TC é a melhor modalidade diagnóstica pois permite documentar adequadamente o achado e planejar o tratamento por punção. Quando existe extensão do processo infeccioso na forma de um flegmão ou abscesso em direção a outros órgãos levando a perfurações bloqueadas, fístulas podem ocorrer. Pneumatúria, fecalúria e infecções urinária de repetição ocorrem em mais da metade dos pacientes. O diagnóstico pode ser estabelecido pela TC, a qual evidencia espessamento do cólon sigmóide associado a presença de divertículos e ar no interior da bexiga . A cistoscopia, cistografia e o enema opaco também podem contribuir para o diagnóstico, embora não sejam imprescindíveis à instituição do tratamento cirúrgico. A fístula colovaginal é a segunda mais comum. A passagem de fezes ou ar pela vagina é patognomônica. As fístulas coloentérica, colouterina e colocutânea são raras.



B – Hemorragia digestiva por doença diverticular



Hemorragia gastrintestinal grave pode ocorrer em 3 a 5% dos indivíduos com diverticulose do intestino grosso. Ao contrário da localização mais distal no cólon dos divertículos na população ocidental, a origem do sangramento nesses indivíduos é mais proximal. Existe associação comprovada entre risco de sangramento em pacientes com diverticulose e uso de antiinflamatórios não-esteroidais. A melena é incomum e a hemorragia por doença diverticular manifesta-se na forma de eliminação anal de grande quantidade de sangue vivo inicialmente na companhia de fezes e, posteriormente, na de coágulos, o que acontece com início abrupto e na ausência de dor abdominal. Cólicas abdominais acompanham a necessidade de evacuação.

Ressuscitação imediata por venóclise calibrosa e segura, reposição por cristalóides e concentrado de glóbulos de acordo com a hematimetria e nível pressórico precedem inclusive a investigação diagnóstica na hemorragia digestiva baixa importante. A realização da endoscopia digestiva alta é adequada à exclusão com boa acurácia de origem em trato digestivo alto para o sangramento uma vez que 10 a 15% dos pacientes com hemorragia digestiva baixa podem ter etiologia do sangramento em trato digestivo alto. A realização do exame proctológico com anuscopia não necessita de preparo e é sempre necessária para afastar uma afecção orificial (hemorróidas) ou retal.

A colonoscopia representa o procedimento diagnóstico de escolha desde que o ritmo de sangramento permita a realização do preparo intestinal devido à sua elevada acurácia para o diagnóstico de sangramento de origem colônica bem como devido a possibilidade terapêutica. O preparo intestinal anterógrado é essencial para adequada visão durante o exame. Quando existe instabilidade após ressuscitação ou quando há evidências de persistência de sangramento importante (elevação tímida do hematócrito após reposição e manutenção da enterorragia), o exame indicado é a arteriografia mesentérica.



6. Tratamento



A – Doença Diverticular Não-Complicada



Há duas possibilidades terapêuticas historicamente utilizadas em associação para pacientes com diverticulose sintomática: dieta de fibras e intervenções medicamentosas. Estudos epidemiológicos observacionais do tipo caso-controle suportam evidência de efeito protetor da dieta de fibras sobre o risco de doença diverticular sintomática. Com relação a estudos de intervenção com suplementação de fibras em indivíduos com diverticulose sintomática, a evidência é conflitante. Mesmo diante do conhecimento de que a doença diverticular não regride por modificações dietéticas, indivíduos com diverticulose são estimulados a seguir dieta rica em fibras frente aos benefícios para a saúde que tais dietas oferecem (redução ponderal, dos níveis de gorduras no sangue e do risco coronariano).

Historicamente, pacientes com diverticulose são orientados a evitar a ingestão de sementes e caroços e alertados sobre o risco de que esses alimentos bloqueiam o colo de um divertículo originando diverticulite aguda. Evidência em favor dessa suposição ainda não está disponível. Uma vez documentado o estado de hipermotilidade associado a origem da doença diverticular, sugere-se que antiespasmódicos e anticolinérgicos sejam de utilidade no controle da cólica diverticular e podem ser utilizados sem risco tendo sido excluída a possibilidade de crise de diverticulite aguda.



B – Diverticulite Aguda



A diverticulite aguda não está associada a complicações (abscesso, pneumoperitônio, obstrução ou fístula) em cerca de 70% dos casos e por vezes se decidirá pela necessidade ou não de internação. Por outro lado, a maioria dos pacientes com essas complicações (mais freqüentes em jovens mesmo no primeiro episódio) necessitará de tratamento cirúrgico ainda que muitas dessas operações possam ser convertidas em procedimentos eletivos. A primeira decisão acerca do tratamento de um paciente com diverticulite envolve determinar sua necessidade de internação. Pacientes com sintomas leves de dor abdominal, sem sinais sistêmicos (febre e queda do estado geral), com trânsito normal e capazes de assumir dieta oral e com cognição razoável para entender as explicações sobre as indicações de sofrer reavaliação podem ser tratados sem hospitalização. O tratamento inclui dieta sem resíduos, hidratação oral e antibioticoterapia por via oral (metronidazol, ciprofloxacina ou amoxicilina-clavulanato). Melhora sintomática é observada 48 horas, após o que a dieta pode progredir para normalidade. Pacientes submetidos a tratamento ambulatorial devem ser submetidos a ultrassonografia abdominal e avaliação laboratorial por hemograma como mínima investigação. Em contraposição, pacientes muito idosos, diabéticos ou imunossuprimidos, em corticoterapia prolongada, incapazes de tolerar dieta e hidratação oral, com dor abdominal importante, com suspeita de complicações e/ou sem melhora, indica-se a internação hospitalar. Todos os pacientes submetidos a internação devem se submeter a TC. Pacientes hospitalizados inicialmente são tratados por jejum. A critério, podem beber líquidos sem resíduos. Soroterapia de manutenção com cristalóides e eletrólitos é realizada. A antibioticoterapia é mais baseada em consensos do que em ensaios clínicos randomizados. Inclui mais freqüentemente cobertura contra anaeróbios com metronidazol ou clindamicina associados a aminoglicosídeos (amicacina ou gentamicina) ou cefalosporinas de terceira geração (ceftriaxone, cefotaxima ou ceftazidime). Mais modernamente, a terapia com ertapenem pode ser utilizada nos casos complicados ou não por abscesso.

Melhora sintomática e laboratorial deve ser esperada em dois a quatro dias. Piora clínica sugere diagnóstico incorreto ou peritonite generalizada não-detectada, a qual está associada a mortalidade maior do que 30%. Ausência de melhora ou quadro clínico arrastado sugerem presença de abscesso. Para pacientes com crise de diverticulite aguda e para os quais é feito diagnóstico de abscesso com pelo menos 5 cm de tamanho em posição pericólica, opta-se pela drenagem percutânea guiada, o que traz indiscutível melhora clínica em todos os casos sem os riscos da anestesia geral e permite postergar o tratamento cirúrgico para condição eletiva, evitando-se, assim, operações em dois tempos (com construção de colostomia).



C – Tratamento cirúrgico de urgência



Estima-se que 15 a 30% dos pacientes hospitalizados com diverticulite aguda necessitarão de tratamento cirúrgico. Os objetivos do tratamento cirúrgico são: remoção do segmento perfurado (sigmoidectomia), redução da contaminação (lavagem da cavidade), e, quando possível, restabelecimento do trânsito intestinal (anastomose primária). As indicações clássicas de tratamento cirúrgico na urgência são:

1.      Diagnóstico ou suspeita de peritonite generalizada;

2.      Diagnóstico de abscesso inadequado à drenagem por punção transabdominal guiada por ultrassonografia ou TC;

3.      Obstrução intestinal não-aliviada;

4.      Piora clínica evidente (piora da dor, do exame físico ou da leucocitose); e mais raramente,

5.      A incapacidade de se afastar neoplasia.

Mais freqüentemente, reserva-se o tratamento cirúrgico de urgência frente ao diagnóstico de peritonite generalizada, à impossibilidade de drenar um abscesso, se a drenagem não desencadeia melhora clínica ou se há ausência de melhora de um modo geral. Nessas situações, a atenção está centrada na adequada ressuscitação ou preparo pré-operatório (reposição volêmica, antibioticoterapia, avaliação da coagulação e correção de eventual anemia) para laparotomia sem preparo intestinal. O paciente é informado sobre a eventual necessidade de estoma e dessa forma se procede à demarcação deste no pré-operatório. A via de acesso videolaparoscópica não é freqüentemente empregada na situação de urgência, devido a dificuldades técnicas para o manejo da peritonite difusa, da obstrução intestinal e na suspeita de malignidade.

Na situação de peritonite difusa purulenta ou fecal (estágios III e IV da classificação de Hinchey — Quadro 1), há pouca discordância sobre a melhor conduta operatória: a operação em dois tempos. Realiza-se a ressecção do segmento perfurado (sigmoidectomia), colostomia terminal do descendente e sepultamento retal preferencialmente com drenagem pélvica (primeiro tempo). Entre seis e oito semanas, procede-se à reconstrução do trânsito por anastomose colorretal (segundo tempo) que pode ser realizada por videolaparoscopia sem necessidade de nova incisão abdominal. Mortalidade elevada está associada a simples laparotomia e drenagem da cavidade, pois nessa alternativa não há remoção do foco infeccioso.

Frente ao quadro de obstrução intestinal associado a diverticulite aguda, entende-se que a melhor alternativa é proceder à tentativa de descompressão nasogástrica, o que leva o paciente a uma situação semi-eletiva, em que a possibilidade de ressecção do sigmóide com anastomose primária pode ser realizada. Frente ao insucesso da descompressão, a laparotomia deve objetivar afastar a presença de obstrução por neoplasia e remover o cólon sigmóide obstruído por diverticulite. Emprega-se mais freqüentemente a operação em dois tempos como descrita para a peritonite generalizada. As operações em três tempos, quando no primeiro tempo é realizada somente uma colostomia em alça do transverso para a descompressão, caíram em desuso devido à necessidade de o paciente enfrentar mais dois tempos operatórios (sigmoidectomia e fechamento da colostomia), associados a uma morbidade cumulativa muito elevada. A realização de anastomose primária sem a necessidade de confecção de colostomia é uma alternativa realizada mais frequentemente por cirurgiões colorretais se realizado o preparo intraoperatório do cólon ou ainda a operação de colectomia total com anastomose ileorretal.

Pacientes submetidos a operações de urgência para os quais o achado intraoperatório foi o de abscesso localizado ou flegmão (estágios I e II da classificação de Hinchey) podem ser submetidos a ressecção com anastomose primária. A principal contra-indicação para a realização de anastomose primária é a peritonite difusa purulenta ou fecal. As demais contra-indicações são relativas e incluem achados operatórios (abscesso pericólico ou pélvico), condições clínicas (desnutrição, anemia, corticoterapia ou terapia imunossupressora) e experiência do cirurgião.









D – Tratamento cirúrgico eletivo



O risco de recidiva de um episódio agudo de diverticulite aguda situa-se entre 7% e 62%, sendo que a maioria dos pesquisadores estima essa chance em um terço. Metade dessas recidivas ocorre ainda no primeiro ano e 90%, após cinco anos. O seguimento de longo prazo prevê uma incidência de reinternação por crise de diverticulite aguda de 2% ao ano em pacientes submetidos a tratamento clínico com sucesso de episódios pregressos de diverticulite aguda. De modo que a ressecção cirúrgica eletiva não é necessária para muitos pacientes que responderam ao tratamento clínico na primeira crise.

Há, no entanto, risco aumentado de complicações após uma segunda crise de diverticulite aguda, uma vez que o risco de complicações durante um próximo surto agudo atinge 60% e a mortalidade duplica. Apenas 10% dos pacientes após uma segunda crise de diverticulite evolui de maneira assintomática. Como resultado, o tratamento cirúrgico eletivo da diverticulite está indicado para pacientes após uma crise complicada (abscesso, obstrução ou fístula) e para aqueles que tiveram duas crises necessitando hospitalização. Essa recomendação, no entanto, vem sendo questionada pois alguns autores entendem que a indicação cirúrgica deve ser individualizada e levar em conta as condições clínicas do paciente e o grau de incapacidade que a crise trouxe. Quando se considera a via de acesso videolaparoscópica, a morbidade de uma nova crise deve ser comparada com a do tratamento cirúrgico (significativamente diminuída).

O tratamento cirúrgico eletivo, quando indicado, é realizado dentro de seis a oito semanas após uma crise de diverticulite aguda. Pacientes imunossuprimidos (transplantados e com a síndrome da imunodeficiência adquirida) e aqueles com afecções do tecido conjuntivo são mais susceptíveis a infecção, têm deficiência do processo de cicatrização e maior incidência de complicações da diverticulite aguda. Para esses pacientes, o tratamento cirúrgico eletivo está indicado após o diagnóstico de uma crise de diverticulite aguda. Para os indivíduos jovens, costuma ser oferecido após a primeira crise de diverticulite devido à maior chance de recidiva e também à maior gravidade dos episódios nessa população.

As operações eletivas são realizadas após a realização de preparo intestinal completo e sob antibioticoprofilaxia de amplo espectro. Pratica-se a sigmoidectomia ou a colectomia esquerda com anastomose colorretal manual ou mecânica. A operação pode ser realizada pela via de acesso videolaparoscópica. Contra-indicações relativas à essa via de acesso são a presença de cicatriz abdominal prévia, massa palpável, diagnóstico de fístula e índice de massa corporal maior do que 35 kg/m² . Apesar de constituir ainda em nosso meio técnica associada a maior custo e dependente da experiência do cirurgião, experiências uni e multicêntricas consistentemente demonstraram a segurança e eficácia dessa via de acesso para o tratamento cirúrgico eletivo da diverticulite aguda. Menor dor, menor duração do íleo pós-operatório e da internação hospitalar já foram demonstrados por estudos retrospectivos e prospectivos comparando a via de acesso convencional com a videolaparoscópica. Frente ao achado de fístula colovesical, o tratamento cirúrgico é fundamentalmente o mesmo. Realiza-se a mobilização para ressecção do sigmóide que inclui a dissecção e identificação da fístula colovesical, o que representa mais propriamente uma perfuração bloqueada. Procede-se à separação dos órgãos e verifica-se a necessidade de rafiar a bexiga.

Há evidências que apontam para risco de recidiva de crises de diverticulite após tratamento cirúrgico de até 10% sendo que pode haver necessidade de reoperação em cerca de 3%. A principal medida objetivando evitar a ocorrência de recidiva sintomática após tratamento cirúrgico eletivo da diverticulite é de ordem técnica e consiste em realizar a anastomose do cólon descendente diretamente com o reto. Segmento de cólon sigmóide remanescente em posição distal à anastomose parece albergar divertículos capazes de originar complicações.



D – Hemorragia digestiva por doença diverticular



A história natural da doença diverticular hemorrágica é bem conhecida. A hemorragia cessa espontaneamente em 70 a 80% dos casos. O risco de ressangramento, no entanto, é superior a 30%. O risco de um terceiro episódio de sangramento é de 50%. O objetivo do atendimento aos pacientes com hemorragia por doença diverticular é diagnosticar a origem do sangramento (o que nem sempre é possível) e proceder ao tratamento endoscópico quando a hemorragia não houver cessado espontaneamente, postergando a indicação de tratamento cirúrgico para uma situação eletiva.

No que se refere à terapia endoscópica disponível para o sangramento digestivo baixo, não há aparentemente dados na literatura para avaliar a superioridade de qualquer um ou de sua associação. O tratamento cirúrgico de urgência se impõe quando a hemorragia não houver cessado espontaneamente e após o insucesso do tratamento endoscópico. As colectomias segmentares só devem ser realizadas se houver diagnóstico da origem do sangramento. Para os pacientes com sangramento persistente e na ausência de diagnóstico endoscópico ou arteriográfico, a colectomia total deve ser realizada.



FONTE: http://www.abcdasaude.com.br/gastroenterologia/diverticulite-diverticulose-do-intestino-grosso